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Antes e Depois

 Antes das eleições, o Faial era uma ilha em estado de urgência permanente.

Falava-se, finalmente, do que realmente importa: o Aeroporto da Horta — permanentemente com limitações e que continua a ostentar o título de “internacional” apesar de mal conseguir ver aviões levantar voo com todos os passageiros e respetiva bagagem — e do Porto da Horta, esse gigante adormecido que já teve mais importância do que hoje, mas que parece condenado ao esquecimento, enquanto a chamada economia azul vai ficando por rascunhos e intenções.

Durante semanas, os grandes temas fizeram manchetes e renderam minutos na televisão. Durante semanas, os temas foram debatidos, prometidos e re-prometidos. Fizeram-se vídeos, visitaram-se locais, anunciaram-se milhões para estes dois investimentos estruturantes para o futuro da ilha e a sua ligação ao mundo. Tudo era estrutural, tudo era urgente. As eleições estavam à porta — e os Faialenses, fartos de esperar por vez, responderam com o voto, penalizando quem, durante demasiado tempo, adiou o essencial.

Mas mal passa o frenesim do boletim de voto, instala-se a rotina do esquecimento.

O que era urgente volta ao fundo da gaveta. O aeroporto continua por resolver e o reordenamento do porto continua perdido em papéis. Retoma-se o guião habitual: mais um estudo, mais uma comissão, mais um projeto, mais um adiamento. E, inevitavelmente, mais uma legislatura, mais um mandato a ganhar tempo.

E lá fora? No país inteiro, a história repete-se com outra paisagem. Antes das eleições, falava-se a sério: Saúde e Habitação. Listas de espera que não acabam, falta de resposta nos serviços básicos e casas cujo preço expulsou metade de uma geração do sonho de ter um lar. Era nisso que todos pensavam, era isso que fazia falta.

Mas, mal passam as eleições, muda o disco. Saúde? Habitação? Já não rendem. A prioridade virou-se para a Imigração associada à insegurança— o novo bode expiatório nacional — e para uma Reforma Laboral que ninguém pediu, mas que vai doer a muita gente. Deixou-se de falar do que era necessário e passou-se a falar do que convém a agendas ideológicas ou serve apenas para distrair do essencial.

Discute-se cortar a licença de amamentação, como se os bebés tivessem horários de escritório. Quer eliminar-se a falta por luto gestacional, como se perder um filho antes de nascer fosse detalhe. Põe-se em causa o direito de pais com filhos pequenos ou com deficiência recusarem trabalho ao fim de semana, como se a produtividade valesse mais do que a dignidade.

É este o padrão: antes das eleições, ouvem-se as dores do povo e prometem-se curas milagrosas. Depois, instala-se uma amnésia seletiva impressionante.

No Faial, como no país inteiro, o que se diz em campanha é apenas o que se quer que o povo acredite. O que se faz — ou, na maior parte das vezes, o que se não faz — é que revela o verdadeiro plano.

Porque em política, já se sabe: há sempre um “antes” feito de promessas...
...e um “depois” que raramente tem algo a ver com isso.

(artigo publicado na edição de 8 de Agosto 2025 do Tribuna das Ilha)



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