À data que
escrevo, passaram-se 70 dias deste o primeiro caso confirmado com COVID-19 em
Portugal e 57 dias do primeiro caso nos Açores. Ainda vai ser preciso muito
mais tempo para melhor compreender o vírus e ter as ferramentas apropriadas
para o combater, como também para ultrapassar todos os seus efeitos nas nossas
vidas e na economia.
Foi evidente que
nenhum país estava devidamente preparado para esta pandemia. E prova disso foi
a dificuldade inicial em lidar com o problema e os obstáculos com que todos se
depararam na aquisição de máscaras e de ventiladores.
Em Portugal
podemos afirmar que este primeiro embate correu bem melhor do que o esperado,
tendo em conta o que era projetado e os relatos que vinham dos nossos vizinhos europeus.
O facto de termos antecipado medidas restritivas, quando comparando com outros
países, e as mesmas terem sido acatadas pela população, bem como, termos tido a
capacidade de realizar testes em massa, são fatores que aparentemente
contribuíram para tal. Apesar da pressão sentida, a capacidade de resposta do
SNS nunca foi ultrapassada.
Nos Açores essa
antecipação foi ainda mais evidente. Criaram-se quarentenas para quem entra na
Região, antes mesmo da existência de casos, e as escolas fecharam com um único
caso registado. No dia 19 de março, previamente à declaração do Estado de
Emergência, e já depois das constantes recomendações para não viajar, o Governo
Regional cancelou todas as ligações inter-ilhas e para o exterior da SATA, bem
como as ligações marítimas.
Para além disso,
e de uma forma generalizada, são múltiplos os exemplos em que, fomos sempre
além do que era exigido ou realizado a nível nacional, designadamente, os
testes a quem chega do exterior da Região, depois das quarentenas obrigatórias,
bem como quarentenas para os casos recuperados com mais testes associados.
Compreende-se a
antecipação e o excesso de zelo, tendo em conta a nossa realidade arquipelágica
e a dificuldade que é ter os meios apropriados espalhados por 9 ilhas, mas
temos que aprender a viver nesta nova realidade.
Talvez por isso
não passámos por uma fase de mitigação e sim da contenção para o levantamento
de restrições, com 4 ilhas sem casos e outras 3 sem casos há mais de 1 mês. No
Faial já são 42 dias sem novos casos.
É também com
alguma apreensão que vejo algumas comparações, como por exemplo, as que não têm
em conta o número de testes realizados por habitantes. Se testamos pouco é
óbvio que se detete menos casos e todos nós já sabemos a quantidade de casos
assintomáticos ou com sintomas ligeiros. Quanto mais se testar mais os valores
se aproximam da realidade e nesse aspeto o nosso País (e a Região) está
destacado no pelotão da frente.
Para terem uma
ideia, Portugal faz 5077 testes por 100 mil habitantes e os EUA, a maior
potência económica do Mundo, faz 2700 por cada 100 mil. Da mesma forma que os
Açores fazem 3930 testes por cada 100 mil habitantes e a Madeira apenas 540 por
cada 100 mil.
Vamos todos
aprender com o sucedido, ou não fosse esta uma situação sem precedentes nas
nossas vidas, porque se muitas coisas correram bem, outras há que podiam ter
corrido melhor.
Há contudo algo
que me intriga. O constante julgamento depreciativo, e muitas vezes ofensivo, nomeadamente
de quem está confortável em sua casa, regra geral, sem nenhum conhecimento
sobre o assunto, contra quem está na linha da frente e que de uma forma
incansável e corajosa, assume a responsabilidade.
As divergências
de opinião são algo de salutar, tenho também algumas sobre o tema (que tentarei
expor em próximos artigos), mas devidamente fundamentadas e não baseadas em
achismos ou bitaites…ou com outros objetivos. Infelizmente, exemplos não têm
faltado e algumas são autênticas faltas de respeito, não só pelas Autoridades
de Saúde, como para o trabalho realizado pelos profissionais de saúde e pelos
laboratórios certificados dos Açores.
Na época das
redes sociais, dos lugares comuns, onde todos disparam a sua opinião crítica, na
maioria das vezes sem conhecimento da situação ou fundamentação sólida, as
palavras de Carl Gustav Jung tornam-se mais atuais do que nunca, “Pensar é
difícil, é por isso que as pessoas preferem julgar”.
10 Maio 2020
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