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Os Açores na encruzilhada da dívida: entre promessas e realidade

 Se os Açores fossem uma nação independente, a entrada da Troika seria uma evidência. O gráfico da dívida pública não deixa margem para dúvidas: a administração regional segue com um aumento vertiginoso nos últimos anos. O gráfico foi retirado do Banco de Portugal, o traço na vertical foi colocado por mim e separa o período do atual governo (à direita) do anterior.  O Banco de Portugal documenta um cenário preocupante, onde a trajetória da dívida parece descolada da realidade do discurso de alguns protagonistas.

A ajuda financeira recente de 75 milhões de euros do Governo da República, destinada exclusivamente ao pagamento de dívida, foi tratada com um silêncio estratégico entre governos da mesma cor política. Essa injeção de liquidez, somada a 150 milhões em autorizações de endividamento e 110 milhões de empréstimos diretos, serve apenas para tapar buracos imediatos e demonstra a assistência financeira que esta a decorrer.

O endividamento regional ultrapassou a marca de 1000 milhões de euros em apenas três anos e meio do atual governo. E, enquanto a população enfrenta dificuldades, o escrutínio público permanece, paradoxalmente, silencioso.

Os desafios concretos acumulam-se, desde a 3ª administração consecutiva nomeada para o Grupo SATA até prejuízos médios de 46,3 milhões de euros nos últimos 4 anos (45M€ só nos primeiros 6 meses de 2024), ultrapassando largamente os valores pré-pandemia.

Para compensar a dívida galopante e as benesses dadas às empresas que faturam mais ou àqueles que têm empregos mais seguros, o Governo atual mantém impostos altos sobre combustíveis para equilibrar a balança, atrasa um sem número de apoios a cidadãos e empresas, bem como pagamentos essenciais à SATA e aos hospitais, aprofundando o desgaste da companhia e do sistema regional de saúde.

Na prática, cerca de 25% da população açoriana vive abaixo da linha da pobreza. Somos a região com piores indicadores na pobreza e desigualdade sociais e os valores recentes indicam que estamos piores do que em 2020. Acresce a isto que quase 10% da população enfrentam problemas relacionados ao consumo de álcool e drogas.

O custo de vida dispara: em janeiro o preço de uma garrafa de gás aumentou 5,47€ nos Açores, um aumento exorbitante de 30% para quem já enfrenta dificuldades. Rendas e prestações habitacionais tornaram-se proibitivas, tornando também difícil uma educação universitária no exterior.

Enquanto isso, o Governo Regional parece desconectado da realidade quotidiana. Para cada problema enfrentado, há uma resposta política clara e repetida à exaustão: se há algo errado, a culpa é dos governos anteriores. Passados 4 anos, ainda não há soluções concretas e estruturais para lidar com os desafios regionais e a divida agudiza-se para valores nunca vistos. 

Resta esperar que a comunicação social nacional se lembre dos Açores e sirva como um agente de alerta e pressão para transformar essa realidade. Mas o verdadeiro despertar só virá com uma sociedade civil mais participativa, informada e exigente.

Afinal, não basta repetir que "vai ficar tudo bem" – é preciso construir um caminho onde isso seja verdade.

(artigo publicado na edição de 10/01/2025 do Tribuna das Ilhas)

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